Segunda-feira, 19 de Julho de 2010

A ESPIONAGEM

HETERONÍMIA AINDA

por Rodrigo da Silva

 

 Se disse na última crónica que são cinco os executores da Heteronímia, posso acrescentar um outro que me ocorreu ao ler fortuitamente um artigo sobre espionagem - o/a agente de espionagem. E depois de alguma meditação posterior, poderei muito bem acrescentar mais  outro - o poeta singelo, seja ele qual for, sem extravasar em demasia a temática, o que somam ao todo sete, número cabalístico e que me parece adequado à exposição dos fenómenos neurológicos que lhe estão associados. O primeiro mencionado é mais adequado ao ideário aqui desenvolvido, e o segundo mais ligado à criação à poeisis; a esta me referirei sumariamente, isto é, à acção - à poeisis, da qual ainda não falei minimamente, mas deixarei o desenvolvimento para um entendido nesta matéria (acho eu que é, mas vocês leitores confirmarão se se disponibilizarem a esse obséquio), ao poeta que se dá pelo nome altérnimo Daniel Cristal; ele discorrerá garantida e brevemente sobre esta área estética no seu blogue pessoal, conforme e segundo me prometeu; estejam por isso atentos ao blogue, se se interessarem por estas coisas eruditas, pouco badaladas hodiernamente. E já que vos iniciei nestas locuções especulativas estéticas, literárias e por extensão humanas, dada a minha obsessão pelas estruturas e modos processuais de gestação artística, destas duas restantes raciocinarei nesta crónica anacrónica.  

 

O tipo do espião ou espia que alguns Estados utilizam na recolha de dados secretos de outros Países adversos, enquadra-se perfeitamente no teor desta matéria: a Heteronímia. Ele/a é uma pessoa que usa a dupla personalidade, recorre a nomes diferentes ou alheios surripiados ou inventados com propriedades verosímeis, embora tenha só um que o/a identifica pela nascença: nome próprio, pai e mãe, data e local de nascimento, País de origem. É a pessoa que engana toda a gente por mais esperta que esta seja. Chega ao ponto de trair dois Estados adversos, informando-os mutuamente de dados extremamante sigilosos, segredos de Estado, que cada um guarda no melhor cofre inexpugnável deste mundo. Informa os casos mais atrevidos e audazes, aceitando vencimento e alvíssaras de cada um, sem que nenhum saiba da traição ardilosa, que está por trás, julgando ambos que ele só trabalha para um dos lados. De facto, espiando para um, pelo qual é contratado, consegue em alguns casos, ser pago pelos dois, isto é, também pelo Estado que é espionado. Traição dupla, como é evidente. Engana, como disse toda a gente, bufando segredos e recebendo proveitos de ambas as partes adversas e opostas.

 

Destarte engana o mundo inteiro. E usa a heteronímia para cumprir a preceito todas as suas tarefas. A vizinhança conhece-o erroneamente e considera-o um dos seus entre a comunidade, frequenta cafés, restaurantes, cinemas, teatros, salões de festas, seduz secretárias/os de pessoas do topo do poder, enfim é um cidadão normal, mesmo que seja estrangeiro, e é pessoa integrada no sistema em que se estabelece, afectuoso, quando na realidade ele trabalha contra essa comunidade, colhendo e desvendando informações valiosas para conhecimento de directores de polícias secretas. Consegue em suma iludir o meio envolvente onde se insere cómoda e confortavelmente. Pode ser consultor, mediador, agente de negócios ou ter outra profissão respeitável e aceite no meio. Ele/a é por índole própria discreto exercendo uma actividade comummente aceitável e naturalmente aceite. Na realidade, alterna-se num difícil jogo de espelhos paralelos, em que alguém não é uma pessoa nem outra. de quem se desconfie.

 

A vida familiar é posta em segundo plano ou terceiro, ao ser capaz de arranjar amantes ali e acolá, para elas lhe passarem informações valiosas. Quando a sua actividade condenável é descoberta ou denunciada a sua actividade, a vizinhança fica estupefacta e desiludida pela ingenuidade com que foi levada pela natural credulidade do ser humano. Na verdade, poucos, muitíssimos poucos conseguem ser espiões ou espias, uma vez que que, além de qualidades prematuramente natas possuem uma excelente racionalidade, capacidade superior de planeamento, são autênticos camaleões, mestres com qualidades exímias no disfarce, são dotados de admirável esforço psicológico, metódicos e perfeccionistas na simulação, como fazem os predadores na natureza animal selvagem. E como comungam abertamente da vida vulgar, normal, trivial, ninguém se apercebe que mudam de pele e de coração com toda a naturalidade. No fundo, planeiam as suas acções ao milímetro e seguem implacavelmente a sua trajectória sem empecilhos ou divergências, ainda que lhes possam obstaculizar a informação com falsidades próprias da contra-informação ou contra-espionagem. De facto, possuem o lóbulo central do seu cérebro a funcionar primorosamente.

 

Falta então o último utilizador da heteronímia, este o mais subtil e mais delicado. Referir-me-ei aqui, ao de leve, pois como disse no início passarei a palavra ao poeta Daniel Cristal que a inserirá no seu blogue e que a desenvolverá aí mesmo dentro de pouco tempo. Mas aproveito para aguçar a curiosidade ao leitor com esta revelação: o poeta que, ao exercer a intuição como meio de mergulho na maior profundeza da terra e por extensão ilimitada no universo, assim como a sua percepção mais intimista, descreve e narra rigorosamente com a máxima estesia o decurso da acção de raros fenómenos observados da e na natureza, aos quais vulgarmente não damos valor nenhum por serem tão vulgares e naturais, ele está a revelar autênticos milagres, mistérios insondados da «res naturae», e exerce a poïesis, expande as suas interpretações mínimas e/ou máximas dum modo artístico numa revelação única e original. Não é ele que descreve ou narra ou musica ou desenha ou pinta ou esculpe ou arquitecta. É o seu imo, um estado muito íntimo que se encontra permanentemente em comunhão com o mundo físico e energético; é o estado perfeito da concepção holística. Não é ele que se exprime, é toda a força telúrica e anímica, toda a potencialidade fenomenal do universo que se manifesta imperscrutável para a sensibilidade comum. E nesse estado do seu imo, ele deixa de ser o autor para ser um tradutor mediúnico do todo global extasiante que deflagra. A poeisis deixa de ser a acção helenística repentina e escassamente momentânea para fazer parte dessa mediunidade, que anima a sua alma e dela e nela se realiza. É o tempo de produção que recorre à memória, perscrutação e ao saber, e que põe mão a técnicas e conhecimentos de estesias para fazê-las perdurar numa acção durável do produto acabado ou até mesmo inacabado. O que age em fracções de segundo no tempo acaba por ser um produto fixado como clipe, captado para a máxima eternidade possível, só conseguida por artifícios e rendilhados, sem costuras reveladas, como seja uma revisita a um mundo ignorado na sua figuração, mas que pode muito bem extasiar quem o recebe com a sensibilidade atenta e inexoravelmente desperta.

 

Finalmente, entre a poeisis e a poesia depois de se ter posto em questão a raiz etimológica, o Autor não seria o Criador da obra mas o seu intermediário da acção exterior por si só criadora. Poderia mesmo prescindir do seu nome e adoptar um heterónimo como se fosse a força oculta do Universo que recria o mundo tal qual é numa evolução interminável. Autor confundir-se-ia com Narrador  e este poderia escolher um destes heterónimos que mais lhe agradasse: Deus, a Energia oculta que transforma o Mundo inteiro, a Divindade-mor, o Arquitecto, Matemático, Físico e Químico, Biólogo, ou seja e em suma, o Ser máximo que  nos conduz neste complexo imenso que é o Universo.

 

Terça-feira, 14 de Julho de 2010

(retardada a postagem por problemas de ligação à Internet)

 

Alguma documentação actual de suporte em 1., a da alínea 2. sairá brevemente):

 

1. OS MAIORES ESPIÕES DA HISTÒRIA:

http://mundoestranho.abril.com.br/historia/pergunta_287230.shtml

 

2. O blogue do poeta Daniel Cristal:

http://www.poetadanielcristal.blogspot.com/

publicado por cronicas-de-rodrigo-da-silva às 11:50
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