Sexta-feira, 22 de Julho de 2011

A MÚSICA (Homenagem a Mozart e Strauss)

 

 

A MÚSICA

(Homenagem a Mozart e Strauss)

 

Como se constroem os Países? Com a guerra ou com a música? É a pergunta que nos apetece fazer ao visitar estes Países de trespasse, onde preponderou a família dos Habsburgos. E pelo visto, eles edificaram-se por estes dois processos. Mas, também é verdade que eles se desmembraram por um único: a arte bélica. Os Países situados no centro da Europa são do que disse uma prova cabal.

 

Os Habsburgos foram uma família elitista, com o seu autocarácter nobre, centralizada sobre o clã familiar, fechada na sua própria estirpe, calculistas na sua conservação e manutenção nobiliária, servindo-se não só do aparato social e riqueza, como também da música para manter a sua glorificação e a mais alta consideração entre pares nacionais e estrangeiros. Sofrendo alguns deles de deficiências mentais, próprias dos casamentos entre primogénitos e familiares próximos para propagar as suas propriedades territoriais e influência política, o facto de preponderarem na cabeça dos impérios, que pela Europa central se expandiram, mostra algo de surpreendente na História europeia, merecedor de reflexão sociológica. Paralelamente, a Música que fervorosamente apadrinharam, como mecenato renovado na imitação de Roma antiga, tenderia a imortalizá-los no poder, se não fosse o surgimento da guerra napoleónica, e este acontecimento apenas confirma a tese (aqui alvitrada) de que é a guerra que desmembra impérios, mas salva-se, no entanto, fora do tempo, a Música que foi motivo, além de outras causas, de união, e, no fundo, a única abstracção que se mantém, fincando o pé, na sua relação com a possível imortalidade planetária.

 

Essa família compacta e compactada reinou durante seis séculos em territórios díspares, não quanto à sua língua, sendo eslava, mas quanto à sua morfologia geológica acidentada, ocupando mais de metade da Europa, prevalecendo nela um denominador comum: uma via fluvial que nasce na Floresta Negra (Alemanha) e desliza pela França, Checoslováquia, Eslovénia, Hungria e Roménia, e desagua no Mar Negro. O rio segundo maior da Europa serviu de meio de contacto e ligação entre povos diferentes, como acontece com as estruturas rodoviárias, ferroviárias e aéreas do nosso tempo. Esses contactos uniram povos por interesse comercial, meio de escoar mercadorias, transaccionar produtos, assim como transmitir e partilhar conhecimentos e relações amistosas. Mais os aproximou a harmonia que emana da qualidade da Música por eles criada e desenvolvida.

 

Efectivamente, a composição musical ‘Danúbio Azul’ de Joahan Strauss é hoje conhecida em todo o mundo, e é um forte apelo à visita destas regiões centrais. Por isso, não conseguimos resistir a esta chamada. E de visita a Viena, assistindo episodicamente  no Palácio Real de Hofburg, de onde o império dos Habsburgo era regido, a um concerto da melhor qualidade, foi também o nosso modo de prestar uma homenagem aos compositores musicais destes povos que criaram peças maravilhosas, as quais superam a transitoriedade da nossa vida: a eternidade da Música de excelsa qualidade. Mozart, Strauss, Lizt, Beethoven, Bach, Wagner e alguns mais são disso a prova insofismável.

 

Do que nos apercebemos na visita, dois traumas estigmatizados ainda perduram nestes povos. As duas guerras com a Alemanha de Kaiser e de Hitler, especialmente a brutalidade demoníaca nazi, assim como, depois da libertação, a imediata ocupação ideológica e política imposta pelos regimes comunistas votados com uma aparência inteiramente democrática, de que hoje ninguém acredita ao reconhecer-lhe uma falsidade e um fingimento sem virtude e sem honra, manipuladora imperdoável da crença nos melhores valores da Humanidade.

 

Efeito da guerra, muita da sua arte arquitectónica foi destruída, sendo agora lentamente recuperada, e também por consequência dela, o Império Austro-Húngaro foi desmembrado e deu lugar a pequenos Países. Porém, une-os um forte sentimento saudosista do passado imperial e uma envergonhada admiração recatada e recíproca, acicatada por uma glória perdida, que dificilmente voltará a existir da mesma forma.

 

Não me desvio da nota tónica posta nesta crónica: não é alheia a essa época de esplendor a existência duma Música que não exprime o signo verbal, todavia retine a chama íntima da emoção psicossomática.  E o romantismo ainda se evidencia por causa desse grande amor, algo efémero, entre o imperador Francisco José I e a Isabel da Áustria (Sissi), cuja história não deixa de ser surpreendente e contraditória.

 

Além dos monumentos e do conjunto arquitectónico já recuperado, uma menção especial para Karlovy Vary/Karlsbad, que conserva um cenário arquitectónico com especial relevo assombroso. Curiosamente, passou incólume por todas as guerras, tal a admiração que os invasores desta linda e excepcional povoação a ela votaram, e dela usufruíram, como se fosse uma jóia de estimação, aproveitando o repouso dourado dos artefactos.

 

Realmente, percorrer a rua, ao lado do rio Teplá, é um espectáculo surpreendente, ainda que estático, com excepção das águas quentes do ribeiro, trajecto onde muitas figuras da cena mundial de outrora e de agora fruíram os seus encantos, e deixaram lastro na sua exibição pessoal que alguns cafés ostentam fotograficamente para que os visitantes anónimos aí se espantem perante tanta fama e beleza materializadas na obra de arte deixada pelo homem por este planeta fora e particularmente neste sítio. É efectivamente obrigatório conhecer uma vez pelo menos na vida a obra que certamente nos espanta e maravilha.

 

Em conclusão: se os Países podem unir-se pela Música, essa Arte suprema que assombra os povos mais instruídos e educados, é a Guerra que os desbasta e os desmembra até à quase insignificância, mantendo-se contudo Aquela como farol timoneiro, até ao dia em que este Planeta deixe de ser o que é (e é bom que nos lembremos disto de vez em quando).

 

Ilustrações:

 

http://pt.wikipedia.org/wiki/Casa_de_Habsburgo

 

http://pt.wikipedia.org/wiki/Monarquia_de_Habsburgo

 

http://pt.wikipedia.org/wiki/Isabel_da_%C3%81ustria_(1837-1898)

 

http://pt.wikipedia.org/wiki/Rio_Dan%C3%BAbio

 

http://www.google.pt/#sclient=psy&hl=pt-PT&site=&source=hp&q=Karlovy+Vary%2FKarlsbad&aq=&aqi=&aql=&oq=&pbx=1&rlz=1R2ADFA_pt-PTPT394&bav=on.2,or.r_gc.r_pw.&fp=193c1c151df87692&biw=1280&bih=852

sinto-me: ótimo
música: RDP Antena 2
publicado por cronicas-de-rodrigo-da-silva às 19:45
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